Este foi o belo conto que Luan, da 801, escreveu a partir de "Os desastres de Sofia", de Clarice Lispector:
Eu trabalhava como contador em um banco cujo nome já não lembro. Quando ele foi à falência, fui obrigado a procurar emprego. Encontrei uma escolinha de primário e lá me instalei. Na época já estava viúvo e não cheguei a ter nenhum filho. Já tinha desistido de tudo.
Foi naquela escola que conheci Sofia, a diabinha que fazia questão de me afundar cada vez mais. Via-se que a turma inteira era passiva durante minhas aulas, isto é, ficava lá sentada e olhando para o quadro, porém seus olhares eram vazios e suas cabeças deviam estar ainda mais. Mas Sofia era especial. Além de ignorar meu discurso, me desafiava e lançava um olhar feroz, percrutando todo o meu interior. Maltratava-me, fazia-me gaguejar... e me entendia. Sim, ela entendia o meu sofrimento diário, e era cruel comigo por causa disto. Só até o final do ano, eu pensava, só mais um ano e acabo com essa farsa de marionetes que fingem dar aulas e que fingem aprender.
Ir dar aula era sempre um martírio. Acredito eu que estava já por aquele ano pegando o espírito de professor. Me abalava ver a falta de atenção dos alunos e a minha inutilidade em ensiná-los. Por ela me perturbar e não ser indiferente, eu odiava e amava Sofia. Eu a punha no fundo da sala, tentava ignorar a sua presença, mas meu olhar se atraía por ela e eu desviava a cabeça, tremendo.
Decidi passar uma redação para eles. Contei-lhes uma história sobre um homem pobre que sonhou com um tesouro e passou anos procurando-o. Sem obter sucesso, ele volta para casa. Lá fez uma horta para se alimentar e, de tanto plantar e vender, acabou ficando rico. Uma onde infantil ao trabalho duro. Foi isso que a maioria das crianças concluiu quando mandei-lhes escrever o texto com suas palavras. Sofia não. Depois de escrever o texto voando e me entregar a redação miúda, Sofia saiu correndo para o recreio. Decidi então ler a redação dela para passar o tempo. Lembro que ela concluíra dizendo que não é preciso trabalho duro e sim saber encontrar o tesouro que se esconde. Ora, eu que procurava tão desesperadamente uma maçaneta que abrisse novamente a porta das alegrias da vida, descobri na ponta do meu nariz o meu pequeno tesouro!
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
terça-feira, 9 de outubro de 2012
"Para sempre", de Alyson Noël, e "Moments", de One Direction
Maria Vitória está lendo Para sempre, de Alyson Noël, e relacionou o seguinte trecho do livro com a música "Moments", da banda One Direction:
Maria Vitória registra: "Eu identifiquei os trechos porque na história a Ever(personagem principal) fala de como ela se sente em relação à vida antiga e como ela a acha melhor do que a vida que ela está tendo agora. Já a música fala de momentos que 'ela' quer ter e como queria voltar no tempo para poder ter aquela 'vida por mais um dia' e da tristeza que sente por não tê-la."
"De modo geral, procuro não ficar
relembrando minha vida antiga.Tento não pensar na casa, nos amigos e na família
que tinha, na pessoa que eu costumava ser. Mas, apesar do talento que adquiri para
represar essa tempestade de pensamentos, reconhecendo de antemão os sintomas (os
olhos que começam a arder a respiração ofegante, a terrível sensação de vazio e
desespero), algumas vezes eles caem de paraquedas, sem qualquer aviso prévio, e
não me dão tempo para me preparar. Quando isso acontece, não me resta alternativa
senão me enroscar na cama e esperar que a tempestade passe."
Vocês podem ouvi a canção aqui: http://www.vagalume.com.br/one-direction/moments.html#ixzz2784QSa7A
Aqui está a tradução de um trecho da letra da música:
"Feche a porta, acender a luz fora,
Eu
quero ficar com você
Eu quero sentir o seu amor,
Eu quero deitar ao seu lado
eu
não posso esconder isso
mesmo que eu tente,
Coração bate mais tempo
me escapa as
mãos trêmulas pelo toque
Ele faz isso mais difícil,
E o fluxo de lágrimas para
baixo meu rosto,
Se pudéssemos ter esta vida por mais um dia,
Se pudéssemos
voltar no tempo..."
Maria Vitória registra: "Eu identifiquei os trechos porque na história a Ever(personagem principal) fala de como ela se sente em relação à vida antiga e como ela a acha melhor do que a vida que ela está tendo agora. Já a música fala de momentos que 'ela' quer ter e como queria voltar no tempo para poder ter aquela 'vida por mais um dia' e da tristeza que sente por não tê-la."
domingo, 16 de setembro de 2012
Stephenie Meyer: "Lua nova" e Danity Kane: "Stay with me"
Em seu registro de leitura, Mayumi relacionou a música "Stay with me", de Danity Kane, a um trecho de Lua nova, de Stephenie Meyer:
A música fala sobre uma perda de uma pessoa e é o que tem a ver com o trecho a seguir. Edward deixa Bella e ela fica o procurando na floresta. Então, quando eu ouço essa música, me lembro desse trecho, desse momento.
"– Você prometeu! Em Phoenix, você prometeu que ficaria...
– Cuida-se
Esta é a tradução da letra da música:
A música fala sobre uma perda de uma pessoa e é o que tem a ver com o trecho a seguir. Edward deixa Bella e ela fica o procurando na floresta. Então, quando eu ouço essa música, me lembro desse trecho, desse momento.
"– Você prometeu! Em Phoenix, você prometeu que ficaria...
– Desde que fosse melhor para
você” –ele interrompeu para me corrigir. “–Adeus Bella” –disse ele na mesma voz
baixa e tranquila.
– Espere!– Cuida-se
Veio uma brisa leve, nada
natural. Meus olhos se abriram. As folhas de um pequeno bordo estremeceram com
o vento suave de sua passagem.
Ele se fora.
Com as pernas trêmulas,
ignorando o fato de que minha atitude era inútil, eu o segui. O sinal de sua
passagem desapareceu de imediato. Não havia pegadas, as folhas estavam imóveis
de novo, mas avancei sem pensar. Andei e andei. Passavam-se horas, mas também
apenas segundos. Tropecei várias vezes e, à medida que o dia escurecia, caí
muitas vezes também. Por fim, dei uma topada em alguma coisa –agora estava
escuro, eu não fazia ideia do que prendera meu pé –e caí. Rolei de lado, para
conseguir respirar, e me enrosquei nas samambaias úmidas."
Pingos de chuva caem por todos os lugares
Eu procuro por você, mas você não está aqui
Então eu fico procurando no escuro
Com sua foto em minhas mãos
História de um coração quebrado
(Refrão:)
Fique comigo
Não me deixe ir
Porque eu não posso ficar sem você
Só fique comigo
E me abrace forte
Porque eu construí meu mundo em sua volta
E eu não quero saber como é sem você
Então fique comigo
Só fique comigo...
Eu estou tentando e esperando, pelo dia
E meu toque é o bastante
Para tirar a dor
Porque eu tenho procurado por tanto tempo
A resposta é clara
Ficaremos bem se não deixarmos isso desaparecer
Fique comigo
Não me deixe ir
Porque eu não posso ficar sem você
Só fique comigo
E me abrace forte
Porque eu construí meu mundo em sua volta E eu não quero saber como é sem você
Então fique comigo
Só fique comigo...
Eu tenho procurado por todos os lugares
Por muito muito tempo
Por você e eu, é como essas estrelas que clareiam o céu toda noite
Nossos retratos pendurados
Me lembram dos dias
Você me prometeu que nós sempre
Ficaríamos juntos, e que você nuca iria embora
Por isso é que eu preciso que você fique
Fique comigo
Não me deixe ir
Porque eu não posso ficar sem você
Só fique comigo
E me abrace forte
Porque eu construí meu mundo em sua volta
E eu não quero saber como é sem você
Então fique comigo
Só fique comigo...
Oooo... oh
Não me deixe ...
Então eu continuo esperando no escuro ...
Eu procuro por você, mas você não está aqui
Então eu fico procurando no escuro
Com sua foto em minhas mãos
História de um coração quebrado
(Refrão:)
Fique comigo
Não me deixe ir
Porque eu não posso ficar sem você
Só fique comigo
E me abrace forte
Porque eu construí meu mundo em sua volta
E eu não quero saber como é sem você
Então fique comigo
Só fique comigo...
Eu estou tentando e esperando, pelo dia
E meu toque é o bastante
Para tirar a dor
Porque eu tenho procurado por tanto tempo
A resposta é clara
Ficaremos bem se não deixarmos isso desaparecer
Fique comigo
Não me deixe ir
Porque eu não posso ficar sem você
Só fique comigo
E me abrace forte
Porque eu construí meu mundo em sua volta E eu não quero saber como é sem você
Então fique comigo
Só fique comigo...
Eu tenho procurado por todos os lugares
Por muito muito tempo
Por você e eu, é como essas estrelas que clareiam o céu toda noite
Nossos retratos pendurados
Me lembram dos dias
Você me prometeu que nós sempre
Ficaríamos juntos, e que você nuca iria embora
Por isso é que eu preciso que você fique
Fique comigo
Não me deixe ir
Porque eu não posso ficar sem você
Só fique comigo
E me abrace forte
Porque eu construí meu mundo em sua volta
E eu não quero saber como é sem você
Então fique comigo
Só fique comigo...
Oooo... oh
Não me deixe ...
Então eu continuo esperando no escuro ...
Stephanie Meyer: "Lua Nova", de Stephenie Meyer, e "5:19", de Matt Wertz
Este é o registro de leitura de Maria de Lourdes:
No período da greve, eu li Lua
Nova, da saga Crepúsculo.
Eu peguei o techo em que Edward deixa Bella e a relacionei com a música
"5:19", do Martt Wertz, porque a letra expressa os sentimentos que eu
consigo sentir ao ler o livro. Ou seja, como Bella vai esperar Edward, mesmo
sem saber se ele vai voltar. Trechos:
"-Não Bella. Aonde vamos não é lugar pra você.
-Onde você está é o lugar certo para mim."
"-Bella não quero que que você venha comigo."
"-Você não é boa para mim, Bella"
"O tempo passa.Mesmo quando isso parece impossível.Mesmo quando
cada batida do ponteiro dos segundos dói como sangue pulsando sob umm hematoma.
Passa de modo inconstante, com iguenidas estranhas e calmarias anastadas, mas
passa. Até pra mim."
"-Já se passaram meses. Nenhum telefonema, nenhuma carta, nenhum
contato. Não pode continuar esperando
por ele."
Mas a Bella continua esperando...
sexta-feira, 7 de setembro de 2012
Crônicas de Nelson Rodrigues sobre o Colégio Pedro II
Neste link, vocês podem ler (e reler) algumas crônicas de Nelson sobre a escola: http://blogdoguilhermedecarvalho.wordpress.com/2010/12/22/nelson-rodrigues-ve-o-colegio-pedro-ii/ Deliciem-se!
quarta-feira, 8 de agosto de 2012
Festa Literária da Unidade Humaitá
Queridos alunos:
Adriana Armony, professo do ensino médio, dedicou-se ao longo deste ano para realizar a segunda edição da Festa Literária da Unidade Humaitá. Vamos todos? Acho que a mesa sobre o Nelson Rodrigues, na quarta, será especialmente interessante para vocês. Prometo entregar as redações corrigidas para quem estiver por lá. Não, eu não dou a do colega. Precisa ir. ;)
Aí está a programação:
15/08 – Quarta-feira
9:30 – 12:00 - Abertura: Memórias de Nelson Rodrigues
Nelsinho Rodrigues, Ricardo Oiticica e André Gardel. Mediação: Adriana Armony.
- 14:30 – 16:00 – Novas mídias, novas escritas, com Simone Campos e Ana Paula Maia.
- 16:30 – 18:00 - Literatura e memória, com Alberto Mussa e Ângela Dutra de Menezes.
- 18:00 – 19:30 - A invenção da juventude, com Ricardo Soneto.
16/08 – Quinta-feira
- 10:30 – 12:00 – A experiência da poesia, com Mano Melo e Claufe Rodrigues.
- 14:30 – 16:00 – Ficção e História, com Clóvis Bulcão e Ronaldo Wrobel.
- 16:30 – 18:00 – Cenas da memória em verso e prosa, com Marcelo Moutinho e Ramon Mello.
- 18:00 – 19:30 – Roteiros da Literatura, com David França Mendes e Alexandre Plosk.
segunda-feira, 2 de julho de 2012
Licia Troisi: "Crônicas do mundo emerso -- A garota da Terra do Vento" e Pitty: "Medo"
Victor está lendo A garota da Terra do Vento, da trilogia Crônicas do mundo emerso. Ele relacionou o seguinte trecho à canção "Medo", da Pitty: "O medo é um amigo perigoso: precisas aprender a controla-lo, a ouvir o que ele diz. Se conseguires fazer isto, ele vai ajudar-te a cumprir com o teu dever. Se deixares que ele te domine, vai levar-te ao túmulo." Ele explicou: "Nessa parte do livro a protagonista, chamada Nihal, se torna uma guerreira para vingar seu povo, que foi morto pelo os Fâmins (guerreiros de um tirano). Nihal, seu mestre e companheiros entram em um território livre para defendê-lo dos guerreiros do tirano. Na hora da batalha, ela luta igual a um animal e acaba arriscando a sua vida e de seus companheiros. Então seu mestre a salva e depois lhe dá esse sermão sobre o medo."
Ele enviou o seguinte trecho da letra:
Medo de ter, medo de perder
Cada um tem os seus
E todos têm alguns
Suando frio, as mãos geladas
Coração dispara até sufocar
Medo de ter, medo de perder
Cada um tem os seus
E todos têm alguns
Suando frio, as mãos geladas
Coração dispara até sufocar
quinta-feira, 28 de junho de 2012
Stephenie Meyer: "A hospedeira" e He Is We: "I wouldn't mind"
Andreza está lendo o livro " A hospedeira", que é uma mistura de romance com ficção científica.
Esta parte romântica do livro lhe lembrou a música "I wouldn't mind":
" Se eu tivesse de escolher alguém, qualquer um, para ficar perdida num planeta deserto, seria você", sussurro. O sol entre nóis ardeu mais quente. "Sempre quero estar com você. E não só para...e não só para conversar.Quando você me toca..." Ouso deixar meus braços roçarem lentamente a pele macia de seu braço e sinto chamas fluírem das suas pontas agora. Os braços dele se apertam a minha volta. Será que ele sente o fogo? "Não quero que você pare." Quero ser mais exata, mas não consigo encontrar as palavras. Tudo bem. Já fiz bobagem suficiente admitindo o que admiti."Se você não sente do mesmo modo, eu compreendo. Vai ver não é o mesmo pra você. Tudo bem." Mentiras.
"Oh, Mel", suspira ele em meu ouvido, puxando meu rosto para encontrar-se com o dele.
Mais chamas nos lábios dele, mais ardentes do que as outras, calcinantes. Não sei o que estou fazendo, mas ele não parece se importar. As mãos dele estão em meus cabelos , e meu coração está prestes a entrar em combustão. Não posso respirar. Não quero respirar.
Mas os lábios dele vão para as minhas orelhas, e ele segura meu rosto quando tento encontrá-los outra vez.
" Foi um milagre - mais que um milagre- quando encontrei você, Melanie. Agorinha mesmo, se me dessem a escolha entre ter o mundo de volta e você, não seria capaz de abrir mão de você. De salvar cinco bilhões de vida."
"Isso é errado."
"Muito errado, mas muito verdadeiro."
Esta parte romântica do livro lhe lembrou a música "I wouldn't mind":
" Se eu tivesse de escolher alguém, qualquer um, para ficar perdida num planeta deserto, seria você", sussurro. O sol entre nóis ardeu mais quente. "Sempre quero estar com você. E não só para...e não só para conversar.Quando você me toca..." Ouso deixar meus braços roçarem lentamente a pele macia de seu braço e sinto chamas fluírem das suas pontas agora. Os braços dele se apertam a minha volta. Será que ele sente o fogo? "Não quero que você pare." Quero ser mais exata, mas não consigo encontrar as palavras. Tudo bem. Já fiz bobagem suficiente admitindo o que admiti."Se você não sente do mesmo modo, eu compreendo. Vai ver não é o mesmo pra você. Tudo bem." Mentiras.
"Oh, Mel", suspira ele em meu ouvido, puxando meu rosto para encontrar-se com o dele.
Mais chamas nos lábios dele, mais ardentes do que as outras, calcinantes. Não sei o que estou fazendo, mas ele não parece se importar. As mãos dele estão em meus cabelos , e meu coração está prestes a entrar em combustão. Não posso respirar. Não quero respirar.
Mas os lábios dele vão para as minhas orelhas, e ele segura meu rosto quando tento encontrá-los outra vez.
" Foi um milagre - mais que um milagre- quando encontrei você, Melanie. Agorinha mesmo, se me dessem a escolha entre ter o mundo de volta e você, não seria capaz de abrir mão de você. De salvar cinco bilhões de vida."
"Isso é errado."
"Muito errado, mas muito verdadeiro."
terça-feira, 26 de junho de 2012
Rick Riordan: "Ladrão de raios" (da série Percy Jackson) e Joan Jett: "I love rock and roll"
Publico o primeiro registro de leitura. Ana Beatriz está lendo Ladrão de raios, da série Percy Jackson. Ela escreveu: "Estou no finalzinho, mas outro dia estava ouvindo a música 'I love rock and roll' e, talvez por a narrativa ser totalmente de aventura ou por causa da personalidade de Percy, essa música me lembra muito o livro... rs"
segunda-feira, 25 de junho de 2012
Registros de leitura: o regresso
Para quem esqueceu. Sugeri um trabalho valendo 0,5 ponto extra para ser feito durante a greve. A
proposta é você escolher um livro que queira ler e fazer alguns registros ao
longo da sua leitura. Você pode selecionar o tipo de literatura que for, o que
lhe agradar. Não quero exatamente resumos, mas que você interaja com o que está
lendo. Pode, por exemplo, fazer um desenho ou uma composição a partir de um
trecho do livro. Pode ser também que uma parte do texto lhe lembre uma música,
um vídeo. Também é possível
criticar um trecho que esteja lendo, dizendo do que gosta ou não gosta e por
quê. Envie os registros (sugiro uns três, que acompanhem o percurso de leitura
do livro) para meu e-mail: pinheiro_mariana@hotmail.com.
Registros de leitura
Queridos:
Não tenho recebido os registros de leitura. Se alguém tentou me enviar sem conseguir, verifique se está com o e-mail correto. Não se esqueçam que entre "pinheiro" e "mariana" há um underline, este sinal: _. Não há um hífen, -.
Não tenho recebido os registros de leitura. Se alguém tentou me enviar sem conseguir, verifique se está com o e-mail correto. Não se esqueçam que entre "pinheiro" e "mariana" há um underline, este sinal: _. Não há um hífen, -.
terça-feira, 29 de maio de 2012
Manuel Bandeira: "O bicho"
Como prometido, publico o poema lido em sala nesta segunda-feira.
O BICHO
O BICHO
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Rio, 27 de dezembro de 1947.
sexta-feira, 18 de maio de 2012
Machado de Assis em hipertexto
Hoje lemos "Missa do galo", de Machado de Assis. Para quem quiser conhecer outros textos do autor, existe uma versão em hipertexto que esclarece várias referências da época em que os contos foram publicados. Basta visitar este endereço: http://www.machadodeassis.net/hiperTx_romances/obras/ContosFluminense.htm Aproveitem!
sábado, 21 de abril de 2012
Repórter Rio: reportagem televisiva a respeito do Colégio Pedro II
O portal da escola divulga com destaque esta reportagem televisiva acerca do Colégio Pedro II: http://www.youtube.com/watch?v=4HjwmngvnLk A matéria não tem exatamente o mesmo tema do trabalho de vocês, que se centra nos sessenta anos da Unidade Humaitá. No entanto, pode ajudá-los.
segunda-feira, 16 de abril de 2012
Mário Filho: O futebol e a moda
Mário Filho foi irmão de Nelson Rodrigues e um importante jornalista esportivo. O nome do estádio do Maracanã foi dado em sua homenagem.
O FUTEBOL E A MODA
Como os
vestidos das mulheres, os calções dos jogadores de futebol sobem e baixam. O
caso de um Telê é raro. Telê usa calções largos e compridos, batendo nos
joelhos, feito os jogadores de outros tempos. Há pessoas assim, que se fixam
numa moda qualquer. Conheço uma que ficou em 18, como o almofadinha
caricaturado por Jota Carlos: colarinho alto, de pontas arredondadas, colado ao
pescoço, estufando a papada, as mangas do paletó curtas, as mangas da camisa
compridas, sobrando, gravata-borboleta, paletó bem cintadinho, calças afinando
em funil, apertando os tornozelos, sapatos de bico de lancha, chapéu de feltro
enterrado até a metade das orelhas. Telê procura esconder as pernas finas, o
fiapo que ele é, nos calções largos e compridos. Ou então desafia a moda, fiel
a um modelo que considera clássico.
Se a gente folhear os velhos álbuns, há de chegar a conclusões interessantes a respeito da evolução da moda em futebol. Porque o futebol obedece, também, aos ditames da moda. Tem os seus dândis, os seus ditadores de bom-tom. Marcos de Mendonça (1) usava camisa tipo esporte, ampla, de mangas compridas. Os “outros” gostavam das camisas de lã, pesadas, como aquelas camisas usadas pelos boxeurs, pesos pesados, que precisam perder peso. Mais tarde é que apareceram as camisas de mangas, curtas, leves. Umas de seda. Outras de linho. E Marcos até hoje não compreende por que alguns goleiros abandonaram as mangas compridas. Ele não usava manga comprida por elegância. E sim por conveniência. Para amortecer a bola. Como uma ajuda para um controle mais perfeito da esfera de couro.
Não são os jogadores somente que mudam de camisa. Os clubes também. E o que faz um clube mudar de camisa? Em um dado momento o clube acha que a camisa está fora de moda. Que ela lembra 1908. O Flamengo já foi tricolor. A camisa dele tinha o preto, o encarnado e o branco. Quando o Brasil entrou na guerra, descobriu-se que o Flamengo tinha as cores da bandeira alemã. E isso bastou. O Flamengo tirou o branco da camisa. Ficou rubro-negro. O América, hoje camisa rubra, já usou camisa preta. À Vasco. E o detalhe serve para mostrar a influência portuguesa. O América era o Vasco – o clube da colônia – em novecentos e tantos. Havia uma preferência marcada pelas camisas de cetim. O Fluminense adotou a de malha. E hoje a moda é a camisa de malha.
A casa Clark anunciava botinas para futebol. Eram botinas pesadas, de bico quadrado, chapeadas. Boas para chutes fortes, então os chutes preferidos pela torcida e pelo jogador. Não se “descobrira” ainda o chute seco – o chute de um Nilo, com o pé de moça e chuteira macia como luva.
Em 1912
Belfort Duarte (2) mandou fazer chuteiras
especiais. As chuteiras perderam o aspecto agressivo, famigerado, e tomaram um
ar que poderia ser classificado de esportivo. Era um sapato ou botina comum,
bem reforçada, e com travas, redondinhas, como pequenas rolhas. Mais tarde uma
casa qualquer anunciou chuteiras Marcos. As chuteiras tomavam os nomes dos
craques. E escolhia-se à vontade. “Eu quero uma chuteira à Marcos”. “Eu quero
uma chuteira à Nery”. Calçá-las era estar na moda. Como foi moda calçar
chuteiras brancas e pretas. Com bico estufado. Com amortecedores. E as
chuteiras brancas? Quando houve um furor pelos sapatos vermelhos de mulher,
salto Luís XV, Fortes deu uma demonstração de bom gosto, entrando em campo com
chuteiras vermelhas.
O primeiro calção de futebol nasceu de uma calça velha, cortada um pouco abaixo do joelho. Era elegante esconder a perna. A meia devia subir até a altura da bainha do calção. Exceto se a camisa fosse de cetim. A camisa de malha tinha de ser vestida por cima, puxada até embaixo. Com o tempo, o calção foi encurtando, a camisa foi entrando por dentro do calção. Houve uma época, aqui, que coincidiu com a vinda de Bataclan para o Lírico, em que os calções de futebol quase anteciparam o V-8(3). Curtíssimos. Mostrando coxas grossas e finas, alvas e negras, cabeludas ou depiladas. Eu me lembro, perfeitamente, do sucesso que fizeram os calções de Nestor, então o jogador mais bonito do Brasil, quando o Paulistano, chegando da Europa, enfrentou o Fluminense em Álvaro Chaves. A torcida toda assobiou coió para o “belo Nestor”. E ele, então, só de mau, não deixou Nilo fazer gol. Defendeu tudo.
Os calções de Nestor nem pareciam calções. Lembravam lingerie, escandalizando os pudicos das arquibancadas. Nestor, porém, tinha coisa para mostrar. Umas pernas grossas, roliças. E todo goleiro bonito, depois dele, fez o mesmo. Joel usava calção até em cima. Apertado nas extremidades, como ligas. Outros jogadores, porém, adotaram a moda, apesar de não terem aptidões para ela. Fausto não escondia as pernas finas de ripa que ele tinha. Friedenreich, porém, cioso da glória antiga, não teve coragem de encurtar os calções. Conservou os que usou em 19, quando marcou o gol da vitória contra os uruguaios.
O gorro teve a sua época. Distinguia os goleiros. O primeiro guardião que o usou aqui tinha um nome complicadíssimo, pronunciando-se Cruken. Não se escrevia assim, porém. Escrevia-se com uma porção de cês, agás e erres juntos. O lenço amarrado na cabeça foi introduzido por um centerforward do América, que estudava medicina: João del Nero. Píndaro, porém, preferia enfiar um gorro de marinheiro na cabeça, escondendo as orelhas, quase tapando a vista. Era o tempo em que se andava de chapéu pelo meio da rua. E, em campo, se tinha de botar qualquer coisa em cima da cabeça. Como se a exibição do crânio fosse quase imoral, chocante. Marcos, contudo, penteava o cabelo, bem penteado, e pronto.
Hoje a gente só vê na rua jogador de futebol de clube mambembe. Antigamente, havia uma espécie de footing dos craques. Eles saltavam na esquina e iam a pé até o campo, onde deviam jogar. Para imaginar a cena é preciso dar um pulinho aos subúrbios em dia de jogo. Aparecem os jogadores andando diferente. Uns com plena armadura. Já foi elegante “armar-se”. Botar duas joelheiras, duas caneleiras, duas tornozeleiras. E o jogador, com tudo isso em cima, se julgava muito mais jogador, embora quase não pudesse andar. Agora a gente acha graça, a graça gostosa da ironia. E, por uma associação de idéias, se lembra da Idade Média. Em 23 ninguém se escandalizava com a zaga do América, Durval e João Martins, que aparecia em campo carregando todos os recursos dos arsenais futebolísticos. A torcida do América ficava tranqüila. Dizendo que “assim” nenhum ataque invadiria a área dos rubros. Durval e João Martins eram a zaga “sem família”. E havia uma maneira especial de andar. Um craque não andava como qualquer pessoa. Tinha de “andar” como craque. Com os braços em asa e as mãos para trás.
Quem trouxe para cá a caneleira foi Welfare(4). Ninguém se lembrava ainda da utilidade dos acolchoados por dentro das meias. Se se levava uma canelada, não se achava ruim. Era um osso do ofício, um “sem querer”. O “de propósito” veio depois. E os jogadores trataram de defender-se. Penaforte, por exemplo, passava uma hora se preparando para entrar em campo. Não se contentava com chuteiras. Enrolava as pernas em algodão. E quando ele aparecia dava a impressão de um doente de elefantíase. Penaforte, porém, usava duas pernas grossas. E Fernando Loup, que tinha uma perna mais grossa do que a outra? Também ele só usava a perna esquerda. A direita servia como muleta, para agüentar o corpo, que não era pesado. E não era só Loup. Encontravam-se a três por dois jogadores com uma perna mais grossa do que a outra. Sabia-se pela grossura das pernas se o jogador jogava na esquerda ou na direita. Qual o pé que ele usava.
Para que se veja a influência da moda basta comparar o caso de Osny e o caso de Nascimento. Osny usava pince-nez em campo. E Nascimento, que precisava muito mais de óculos do que Osny, só tinha coragem de ver através das lentes de grau quando acabava o jogo. Em campo ele percebia a bola pela sombra. Floriano chamava Nascimento de ceguinho. Assombrando-se de que Nascimento “visse” pelos pés. O público, porém, que admitiu Osny de pince-nez, não admitiria Nascimento de óculos. O pince-nez de Osny valia como uma afirmação de bom gosto e de amor ao esporte. Era um complemento. Tornando-se célebre, como a fitinha roxa de Marcos e a toalha enrolada no pescoço do próprio Osny, como cachecol. Mário Pinto Guimarães também usava óculos. Qualquer míope podia usar óculos. Não porque houvesse mais garantia, e sim porque a moda o permitia. Hoje um jogador, se quiser usar óculos, tem de entrar em campo de óculos escuros. Com aros brancos.
Agora não se usam mais gorros, não se usam mais bonés, acha-se horrorosa a camisa fora do calção, não se prega mais o escudo do clube na camisa com colchetes de pressão. E acabou o tempo das fitinhas roxas, do lenço pendurado ao cinto, moda introduzida por Luís de Mendonça, irmão de Marcos, do cinto. Nada de chuteiras brancas, ou vermelhas, ou amarelas, que tiveram a sua época: nada de cabeleira de poeta, revolta, à Chico Neto. Os calções desceram um pouco, as meias subiram, porque há bem pouco tempo os jogadores deixavam as meias caídas, mostrando as canelas nuas. Mas ainda se exibem as coxas, grossas ou finas. Telê é uma exceção com seus calções compridos, quase metodistas, pelo rigor moral. E os clubes não têm uma camisa só. Usam pelo menos duas, uma para a tarde, outra para a noite, branca como um dinnerjacket.
quinta-feira, 12 de abril de 2012
Mário Prata: "Você venceu"
Momentos antes de você ser gerado, nove meses antes
de nascer, portanto, você tinha a companhia de três bilhões de espermatozóides
ao seu lado. Não existe nenhuma regressão que faça com que você se lembre deste
primeiríssimo momento da sua existência.
Imagine a cena. Três bilhões de criaturinhas correndo desesperadamente atrás de um único óvulo. E, se você tem uma certeza na vida, é esta: só você chegou lá. Ou seja, você é um vencedor (a). Não sei como foi que eu e você conseguimos esta proeza. Talvez tenhamos atropelado alguns concorrentes, dado cotoveladas em outros. O fato é que estamos aqui. Eu escrevendo e você lendo.
Imagine a cena. Três bilhões de criaturinhas correndo desesperadamente atrás de um único óvulo. E, se você tem uma certeza na vida, é esta: só você chegou lá. Ou seja, você é um vencedor (a). Não sei como foi que eu e você conseguimos esta proeza. Talvez tenhamos atropelado alguns concorrentes, dado cotoveladas em outros. O fato é que estamos aqui. Eu escrevendo e você lendo.
Numa corridinha mixa de 100 metros numa olimpíada o
sujeito ganha louros, medalhas e dinheiro. E concorre com quantos? Dez, doze
pessoas. Mas eu e você corremos contra 2.999.999 (o número pode não ser muito
exato, mas é por aí). E chegamos. E o mais trágico: todos eles morreram. Todos.
Enfim, nascemos matando metade da população atual do planeta.
Chego a algumas conclusões. A primeira, inapelável,
é que nascemos com culpa, meio sem graça, chorando. E já levamos um tapa na
bunda para deixarmos de ser metidos e assassinos. Sim, todo mundo ao seu redor,
te olhando no berçário, e pensando: e os outros? E os outros?
Por outro lado, deveríamos todo dia abrir a janela,
olhar o dia e sorrir, pensando: eu consegui! Eu sou demais! E deveríamos estar
feliz com a nossa condição de vencedores. A primeira batalha, a primeira
maratona, contra bilhões, a gente venceu, Não bastaria isto para sermos
eternamente felizes? Agradecer diariamente a nossa ovular vitória?
Vi no Fantástico de domingo que o terrorista Bin
Laden já matou – com seus atentados – perto de cinco mil pessoas. Já o Bush com
suas duas guerras, matou perto de 10.000. Quem é mais terrorista?
Talvez se o Bin Laden, quando o pai dele estava
fazendo amor com a sua mãe (sim ele deve ter tido uma amada mãe), talvez se ele
ficasse em segundo lugar, teríamos mais 4.000 pessoas vivas. E o Bush (com uma
honrosa medalha de prata), teria deixado mais de 10 mil pessoas vivendo.
Números pequenos, diante dos que eles deixaram para trás ao serem gerados e
gelados.
Fiquei pensando nos espermatozóides que deixei para
trás num dia qualquer de maio de 1945 (será que foi no dia D?). O que seria de
cada um deles, se tivessem passado na minha frente? A única certeza é que
teriam nascido no mesmo dia que eu. Poderia até ser uma mulher. Existe
espermatozóida?
E, ainda abalado com os atentados na Espanha, penso
nos espermatozóides. Já vencemos a nossa principal batalha, já deixamos para
trás bilhões de futuros cidadãos. Por que queremos matar mais e mais e mais?
Será que não basta ao homem ter vencido a sua principal corrida, a guerra do
nascimento? Não deveríamos todos viver apenas para comemorar que conseguimos
nascer, sãos e salvos, sem usar nenhum míssil, nenhuma granada? Ganhamos uma
guerra jogando limpo. Apenas, sei lá como, fomos mais espertos e rápidos que os
nossos outros companheiros de jornada, coitados (literalmente).
A que óvulo estas pessoas que matam inocentes querem atingir? Uma ogiva? Por que eles não matam a própria mãe que os gerou e deixam o resto do mundo em paz?
É, tem uns espermatozóides por aí que poderiam muito bem não ter chegado lá. Alguma coisa eles aprontaram lá dentro para chegarem na frente. Alguém foi subornado lá dentro. Pena que naquele tempo não tinha câmera para filmar as ações intra-uterinas e nem telefone grampeado.
A que óvulo estas pessoas que matam inocentes querem atingir? Uma ogiva? Por que eles não matam a própria mãe que os gerou e deixam o resto do mundo em paz?
É, tem uns espermatozóides por aí que poderiam muito bem não ter chegado lá. Alguma coisa eles aprontaram lá dentro para chegarem na frente. Alguém foi subornado lá dentro. Pena que naquele tempo não tinha câmera para filmar as ações intra-uterinas e nem telefone grampeado.
domingo, 1 de abril de 2012
Rubem Braga: "Viúva na praia"
Ivo viu a uva; eu vi a viúva. Ia passando na praia, vi a viúva, a viúva na praia
me fascinou. Deitei-me na areia, fiquei a contemplar a viúva.
0 enterro passara sob a minha janela; o morto eu o conhecera vagamente; no café da esquina. a gente se cumprimentava às vezes, murmurando "bom dia"; era um homem forte, de cara vermelha; as poucas vezes que o encontrei com a mulher ele não me cumprimentou, fazia que não me via; e eu também. Lembro-me de que uma vez perguntei os horas ao garçom, e foi aquele homem que respondeu; agradeci; este foi nosso maior diálogo. Só ia à praia aos domingos, mas ia de carro, um "Citroen", com a mulher, o filho e a barraca, para outra praia mais longe. A mulher ia às vezes à praia com o menino, em frente à minha esquina, mas só no verão. Eu passava de longe; sabia quem era, que era casada, que talvez me conhecesse de vista; eu não a olhava de frente.
A morte do homem foi comentada no café; eu soube, assim, que ele passara muitos meses doente, sofrera muito, morrera muito magro e sem cor. Eu não dera por sua falta, nem soubera de sua doença.
E agora estou deitado na areia, vendo a sua viúva. Deve uma viúva vir à praia? Nossa praia não é nenhuma festa; tem pouca gente; além disso, vamos supor que ela precise trazer o menino, pois nunca a vi sozinha na praia. E seu maiô é preto. Não que o tenha comprado por luto; já era preto. E ela tem, como sempre, um ar decente; não olha para ninguém, a não ser para o menino, que deve ter uns dois anos.
Se eu fosse casado, e morresse, gostaria de saber que alguns dias depois minha viúva iria à praia com meu filho — foi isso o que pensei, vendo a viúva. É bem bonita, a viúva. Não é dessas que chamam a atenção; é discreta, de curvas discretas, mas certas. Imagino que deve ter 27 anos; talvez menos, talvez mais, até 30. Os cabelos são bem negros; os olhos são um pouco amendoados, o nariz direito, a boca um pouco dentucinha, só um pouco; a linha do queixo muito nítida.
Ergueu-se, porque, contra suas ordens, o garoto voltou a entrar n'água. Se eu fosse casado, e morresse, talvez ficasse um pouco ressentido ao pensar que, alguns dias depois, um homem — um estranho, que mal conheço de vista, do café — estaria olhando o corpo de minha mulher na praia. Mesmo que olhasse sem impertinência, antes de maneira discreta, como que distraído.
Mas eu não morri; e eu sou o outro homem. E a idéia de que o defunto ficaria ressentido se acaso imaginasse que eu estaria aqui a reparar no corpo de sua viúva, essa idéia me faz achá-lo um tolo, embora, a rigor, eu não possa lhe imputar essa idéia, que é minha. Eu estou vivo, e isso me dá uma grande superioridade sobre ele.
Vivo! Vivo como esse menino que ri, jogando água no corpo da mãe que vai buscá-lo. Vivo como essa mulher que pisa a espuma e agora traz ao colo o garoto já bem crescido. 0 esforço faz-lhe tensos os músculos dos braços e das coxas; é bela assim, marchando com a sua carga querida.
Agora o garoto fica brincando junto à barraca e é ela que vai dar um mergulho rápido, para se limpar da areia. Volta. Não, a viúva não está de luto, a viúva está brilhando de sol, está vestida de água e de luz. Respira fundo o vento do mar, tão diferente daquele ar triste do quarto fechado do doente, em que viveu meses. Vendo seu homem se finar; vendo-o decair de sua glória de homem fortão de cara vermelha e de seu império de homem da mulher e pai do filho, vendo-o fraco e lamentável, impertinente e lamurioso como um menino, às vezes até ridículo, às vezes até nojento...
Ah, não quero pensar nisso. Respiro também profundamente o ar limpo e livre. Ondas espoucam ao sol. O sol brilha nos cabelos e na curva de ombro da viúva. Ela está sentada, quieta, séria, uma perna estendida, outra em ângulo. 0 sol brilha também em seu joelho. O sol ama a viúva. Eu vejo a viúva.
0 enterro passara sob a minha janela; o morto eu o conhecera vagamente; no café da esquina. a gente se cumprimentava às vezes, murmurando "bom dia"; era um homem forte, de cara vermelha; as poucas vezes que o encontrei com a mulher ele não me cumprimentou, fazia que não me via; e eu também. Lembro-me de que uma vez perguntei os horas ao garçom, e foi aquele homem que respondeu; agradeci; este foi nosso maior diálogo. Só ia à praia aos domingos, mas ia de carro, um "Citroen", com a mulher, o filho e a barraca, para outra praia mais longe. A mulher ia às vezes à praia com o menino, em frente à minha esquina, mas só no verão. Eu passava de longe; sabia quem era, que era casada, que talvez me conhecesse de vista; eu não a olhava de frente.
A morte do homem foi comentada no café; eu soube, assim, que ele passara muitos meses doente, sofrera muito, morrera muito magro e sem cor. Eu não dera por sua falta, nem soubera de sua doença.
E agora estou deitado na areia, vendo a sua viúva. Deve uma viúva vir à praia? Nossa praia não é nenhuma festa; tem pouca gente; além disso, vamos supor que ela precise trazer o menino, pois nunca a vi sozinha na praia. E seu maiô é preto. Não que o tenha comprado por luto; já era preto. E ela tem, como sempre, um ar decente; não olha para ninguém, a não ser para o menino, que deve ter uns dois anos.
Se eu fosse casado, e morresse, gostaria de saber que alguns dias depois minha viúva iria à praia com meu filho — foi isso o que pensei, vendo a viúva. É bem bonita, a viúva. Não é dessas que chamam a atenção; é discreta, de curvas discretas, mas certas. Imagino que deve ter 27 anos; talvez menos, talvez mais, até 30. Os cabelos são bem negros; os olhos são um pouco amendoados, o nariz direito, a boca um pouco dentucinha, só um pouco; a linha do queixo muito nítida.
Ergueu-se, porque, contra suas ordens, o garoto voltou a entrar n'água. Se eu fosse casado, e morresse, talvez ficasse um pouco ressentido ao pensar que, alguns dias depois, um homem — um estranho, que mal conheço de vista, do café — estaria olhando o corpo de minha mulher na praia. Mesmo que olhasse sem impertinência, antes de maneira discreta, como que distraído.
Mas eu não morri; e eu sou o outro homem. E a idéia de que o defunto ficaria ressentido se acaso imaginasse que eu estaria aqui a reparar no corpo de sua viúva, essa idéia me faz achá-lo um tolo, embora, a rigor, eu não possa lhe imputar essa idéia, que é minha. Eu estou vivo, e isso me dá uma grande superioridade sobre ele.
Vivo! Vivo como esse menino que ri, jogando água no corpo da mãe que vai buscá-lo. Vivo como essa mulher que pisa a espuma e agora traz ao colo o garoto já bem crescido. 0 esforço faz-lhe tensos os músculos dos braços e das coxas; é bela assim, marchando com a sua carga querida.
Agora o garoto fica brincando junto à barraca e é ela que vai dar um mergulho rápido, para se limpar da areia. Volta. Não, a viúva não está de luto, a viúva está brilhando de sol, está vestida de água e de luz. Respira fundo o vento do mar, tão diferente daquele ar triste do quarto fechado do doente, em que viveu meses. Vendo seu homem se finar; vendo-o decair de sua glória de homem fortão de cara vermelha e de seu império de homem da mulher e pai do filho, vendo-o fraco e lamentável, impertinente e lamurioso como um menino, às vezes até ridículo, às vezes até nojento...
Ah, não quero pensar nisso. Respiro também profundamente o ar limpo e livre. Ondas espoucam ao sol. O sol brilha nos cabelos e na curva de ombro da viúva. Ela está sentada, quieta, séria, uma perna estendida, outra em ângulo. 0 sol brilha também em seu joelho. O sol ama a viúva. Eu vejo a viúva.
(Rio, setembro,
1958)
quinta-feira, 29 de março de 2012
Seleção de crônicas
Postarei no blog algumas crônicas de temas variados. É minha intenção divulgar importantes textos desse gênero, junto a outros publicados recentemente. As duas crônicas abaixo têm um assunto comum: a morte de pessoas desconhecidas do público. A primeira -- "Meu primo Raul" -- é do antropólogo Roberto DaMatta. A segunda -- "Luto da família Silva" --, de um dos nossos maiores cronistas: Rubem Braga. Espero que gostem.
Roberto DaMatta: "Meu primo Raul"
Ao lado de Chico Anysio, que vi e admirei uma ou duas vezes
no teatro e em incontáveis ocasiões na telinha da televisão, partiu meu primo
Raul Augusto da Matta. Chico é notícia necessária da mídia e, no jornal, ocupa
toda uma página. Raul é personagem da humilde coluna. Ao jornal às notícias; à
crônica, os fatos da vida e da morte que pertencem eventualmente ao cronista e
por meio dele podem, quem sabe, recompensar o leitor. Mesmo quando o seu centro
é um morto desconhecido da maioria e o texto fala da perda e do luto.
Será preciso lembrar o poeta inglês John Donne, quando ele
descobria que nenhum homem é uma ilha - todo homem é parte de um continente? E
que, quando os sinos dobram, eles têm a autoridade de dobrar para todos nós e
também para o meu primo Raul? "A morte de todo homem", segue o poeta,
"diminui-me porque eu estou envolvido na humanidade."
Estou mais pobre, mas se não fosse por essa morte, eu não
seria alcançado pelo poderoso badalar dos sinos que tocam por todos nós. Meus
olhos estão turvados, mas eu ouço os sons que nos unem e inventam insuspeitas
teias de solidariedade, porque não há como ficar indiferente ao nascimento e à
morte.
Todas as vidas tocam - querendo ou não - muitas outras
vidas. E Raul atingiu a vida de nossa família primeiro na Rua Nilo Peçanha, 31,
no Ingá, casa dos nossos avôs Raul e Emerentina; depois, no apartamento de
Renato e Lulita, meus pais, no Edifício Abaeté, aqui, em Niterói.
A mediunidade da literatura me deixa ver Raulzinho pela primeira
vez. Ele chega, menino alto e de calça curta, segurando uma pequena maleta de
Laranjeiras, Rio de Janeiro. Naquele tempo, eu imaginava a Rua das Laranjeiras
como sendo um laranjal e o Rio de Janeiro como a cidade que tinha todos os
cinemas do mundo na Cinelândia. Raulzinho deixava meus avós orgulhosos e
despertava inveja nos meus irmãos e em mim, porque ele tinha o mesmo nome do
meu avô, o velho Raul, desembargador aposentado e sisudo, cujo prazer mais
visível era fumar um charuto aos domingos. Aos 10 anos, Raulzinho realizava a
façanha de vir das Laranjeiras ao Ingá, em Niterói, tomando bondes e barcas.
Era órfão de pai e visto como audacioso por andar contando somente com ele
mesmo. Logo que chegava, vovó telefonava para a sempre elegante e bonita tia
Celeste, mãe do primo, avisando que estávamos todos juntos, brincando.
Naquele tempo, a morte estava longe de mim. Roberval, o pai
de Raulzinho, havia morrido quando ele era uma criança de 4 anos. Uma variedade
de lúpus o levou em 19 dias aos 39 anos, numa morte que foi o maior golpe
vivido por meus pais, tios e avôs, sobretudo pelo meu avô Raul. O nome do meu
primo falava desse amor feito de obediência, respeito e amizade, tão difícil de
articular entre Raul e esse Roberval roubado pela morte. Raulzinho era o
testemunho vivo dessa ausência. Vocês não sabem o que é não ter pai, dizia ele
para nós, cujo pai - sempre presente - não permitia imaginar essa experiência.
Hoje, como membro da fraternidade dos que enterraram filhos,
estou seguro que a postura soturna de vovô tinha muito a ver com esse Roberval
que foi o primogênito de Raul e Emerentina, dois viúvos que se uniram com
filhos dos seus primeiros matrimônios. Roberval transbordava de gosto pela
vida. Dançava como Fred Astaire e, estudante de Medicina, deu a um viúvo e a
uma viúva, cujo marido foi assassinado na Manaus de 1908, a prova de que a
vida, afinal e a despeito de tudo, valia a pena. Ele está imortalizado numa
fotografia - alto e bonito - ao lado de meu avô Raul, igualmente alto e bonito.
Detalhe: pai e filho estão de chapéu, gravata, colete e de mãos dadas, como
deve ser.
Raulzinho se parecia com o pai. Foi ator e empresário.
Casou-se com a atriz Leina Krespi (que morreu em 2009), teve Patricia e Georgia
e escreveu a peça Caiu Primeiro de Abril, que fez muito sucesso em 1964.
A morte obriga a recordar a beleza e o encanto do primo.
Estudante de teatro, Raul fazia laboratório com as suas apaixonadas. Declarava,
representando, um amor incondicional para, na semana seguinte, desfazer suas
promessas, deixando as moças em lágrimas e às vezes encaminhado-as a nós, os
primos comuns que não moravam no Rio e não possuíam o carisma do ator.
Como não lembrar de Raulzinho, Romero, Fernando, Ricardo,
Renato, Ana Maria e eu dançando com vovó Emerentina, viúva e jogadora
inveterada de pife-pafe e pôquer, capaz de viver com alegria mesmo tendo
enterrado tantos filhos, uma das canções de My Fair Lady na nossa sala de
visitas? Fizemos uma roda ao som do maravilhoso I'm Getting Married in the
Morning, demos as mãos e, com Emerentina no centro, dançamos sacralizando o
apartamento com a música e o amor que amenizam as diferenças e as dores.
Raul está hoje com todos os meus mortos que você, querido
leitor, não conheceu, mas sabe muito bem quem são. A menos que você não tenha
amado, a menos que você jamais tenha ouvido o grande sino que dobra por todo
nós.
Um dia, quando eu também estiver nessa terra dos esquecidos
e, às vezes, lembrados somente para serem definitivamente deslembrados, nós
todos - Raul, Raulzinho, Emerentina, Amalia, Renato, Lulita, Roberval, Rosalvo,
Oyama, Kronge, Marcelino, Silvio, Yolanda, Fernando, Rodrigo, Renatinho, Regina
- e muitos outros; todos esses seres amados, vamos nos encontrar e dançar
debaixo dos acordes do piano de mamãe, na celebração desse casamento combinado
com o fim. O fim sem o qual não seríamos como o Raul desta crônica, amados e
pranteados porque somos tudo: apenas humanos.
Publicado em: O Globo, Rio de Janeiro, 28 mar. 2012, p. A7.
Rubem Braga: "Luto da família Silva"
A Assistência foi chamada.
Veio tinindo. Um homem estava deitado na calçada. Uma poça de sangue. A
Assistência voltou vazia. O homem estava morto. O cadáver foi removido para o
necrotério. Na seção dos "Fatos Diversos" do Diário de Pernambuco, leio o nome do sujeito: João da Silva. Morava
na rua da Alegria. Morreu de hemoptise.
João da Silva — Neste
momento em que seu corpo vai baixar à vala comum, nós, seus amigos e seus
irmãos, vimos lhe prestar essa homenagem. Nós somos os joões da silva. Nós
somos os populares joões da silva. Moramos em várias casas e em várias cidades.
Moramos principalmente na rua. Nós pertencemos, como você, à família Silva. Não
é uma família ilustre; nós não temos avós na história. Muitos de nós usamos
outros nomes, para disfarce. No fundo, somos os Silva. Quando o Brasil foi
colonizado, nós éramos os degredados. Depois fomos os índios. Depois fomos os
negros. Depois fomos imigrantes, mestiços. Somos os Silva. Algumas pessoas
importantes usaram e usam nosso nome. É por engano. Os Silva somos nós. Não
temos a mínima importância. Trabalhamos, andamos pelas ruas e morremos. Saímos
da vala comum da vida para o mesmo local da morte. Às vezes, por modéstia, não
usamos o nosso nome de família. Usamos o sobrenome “de Tal”. A família Silva e
a família “de Tal” são a mesma família. E, para falar a verdade, uma família
que não pode ser considerada uma boa família. Até as mulheres que não são de
família pertencem à família Silva.
João da Silva – Nunca nenhum
de nós esquecerá seu nome. Você não possuía sangue azul. O sangue que saía de
sua boca era vermelho – vermelhinho da silva. Sangue de nossa família. Nossa
família, João, vai mal em política. Sempre por baixo. Nossa família,
entretanto, é que trabalha para os homens importantes. A família Crespi, a
família Matarazzo, a família Guinle, a família Rocha Miranda, a família Pereira
Carneiro, todas essas famílias assim são sustentadas pela nossa família. Nós
auxiliamos várias famílias importantes na América do Norte, na Inglaterra, na
França, no Japão. A gente de nossa família trabalha nas plantações de mate, nos
pastos, nas fazendas, nas usinas, nas praias, nas fábricas, nas minas, nos
balcões, no mato, nas cozinhas, em todo lugar onde se trabalha. Nossa família
quebra pedra, faz telhas de barro, laça os bois, levanta os prédios, conduz os
bondes, enrola o tapete do circo, enche os porões dos navios, conta o dinheiro
dos bancos, faz os jornais, serve no Exército e na Marinha. Nossa família é
feito Maria Polaca: faz tudo.
Apesar disso, João da Silva, nós temos de enterrar você é
mesmo na vala comum. Na vala comum da miséria. Na vala comum da glória, João da
Silva. Porque nossa família um dia há de subir na política...
Junho de 1935
domingo, 25 de março de 2012
Sebastián Borensztein: "Um conto chinês"
Na semana passada, vocês redigiram uma notícia a partir de títulos sobre acontecimentos extraordinários. O roteiro do ótimo filme Um conto chinês também foi criado a partir de uma notícia bastante incomum: uma vaca cai do céu e mata uma jovem. Vale a pena ver. O filme é ótimo. Aqui está o trailer.
Jornal O Dia: capa sobre a morte de Chico Anysio
Como temos discutido o texto jornalístico, publico a capa do jornal O Dia a respeito da morte de Chico Anysio. É muito interessante a concordância verbal na manchete. A resposta para o uso incomum está nas imagens e no pequeno texto na capa. Divirtam-se reconhecendo as personagens de Chico e lendo essa bela página de jornal.
domingo, 11 de março de 2012
Revista Piauí: "Mulher filé dá capilé a repórter nerd"
Na aula passada, lemos um trecho da reportagem "Mulher filé dá capilé a repórter nerd". Quem se interessou pelas manchetes do Meia Hora e quiser saber mais sobre o jornal, pode ler o texto integral. Está aqui: http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-28/anais-da-imprensa/mulher-file-da-capile-a-reporter-nerd
quarta-feira, 7 de março de 2012
Indicação de leitura: "À sombra das chuteiras imortais", de Nelson Rodrigues
Queridos:
Como prometido, divulgo o endereço onde vocês podem encontrar o livro sugerido para este semestre: À sombra das chuteiras imortais, de Nelson Rodrigues. Lembrem-se de que o livro está esgotado. Portanto, só pode ser encontrado em sebos ou na internet. O endereço é este: http://www.acervodanet.com.br/icontrole/images/produtos/0d850e4f5e.pdf
Como prometido, divulgo o endereço onde vocês podem encontrar o livro sugerido para este semestre: À sombra das chuteiras imortais, de Nelson Rodrigues. Lembrem-se de que o livro está esgotado. Portanto, só pode ser encontrado em sebos ou na internet. O endereço é este: http://www.acervodanet.com.br/icontrole/images/produtos/0d850e4f5e.pdf
segunda-feira, 5 de março de 2012
Chico Buarque e Vinicius de Moraes: "Valsinha"
Queridos:
Aí está a música cuja letra lemos hoje. Vale a pena assistir ao vídeo.
Aí está a música cuja letra lemos hoje. Vale a pena assistir ao vídeo.
domingo, 4 de março de 2012
Boas-vindas
Queridos:
Este é o nosso blog. Comentem, participem, enviem textos, façam deste um espaço de todos nós. Para dar as boas-vindas ao nosso ano letivo, publico aqui um curta-metragem a respeito de um poeta lido em nossa primeira aula. Aproveitem!
Este é o nosso blog. Comentem, participem, enviem textos, façam deste um espaço de todos nós. Para dar as boas-vindas ao nosso ano letivo, publico aqui um curta-metragem a respeito de um poeta lido em nossa primeira aula. Aproveitem!
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